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quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Judeus, Árabes, Chineses e o Prêmio Nobel




Por Franklin Cunha*


O Ocidente mostra outra vez que é incapaz de pensar historicamente o islã.
Pedro Martínez Montávez, arabista espanhol (1933-)


Quando, alguns amigos judeus me enviam a lista dos homens e mulheres distinguidos pelo prêmio Nobel da Academia Sueca e assinalam que 70% deles são de etnia judaica e raros são árabes, eu lhes dou os parabéns, mas lhes sugiro que deveriam se aprofundar no estudo da história antes de insinuar uma improvável superioridade intelectual daquela grande variedade de etnias que se chama hoje de “ povo judeu”.

Recentemente, uma chuva de insultos fustigou em Israel o historiador Shlomo Sand ao questionar no seu livro “A invenção do povo judeu“, a identidade dos judeus como nação, identidade essa que pretende ser o cimento do estado sionista e racista de Israel. O livro tem sido alvo de polêmica acirrada onde quer que seja lançado. Shlomo Sand, ele mesmo judeu, sugere as bases para uma nova visão do futuro político da “Terra Prometida”. Formula a tese de que os judeus sempre formaram comunidades religiosas e culturais importantes em diversas regiões do mundo, mas não constituem uma nação portadora de uma origem única. O conceito de estado-nação é, portanto posto em xeque, assim como a ideia de ser Israel um estado pertencente aos judeus do mundo todo – aqueles que escolheram outra pátria em vez de retornar à terra de seus ancestrais. Para o autor, o governo de Israel deveria reconhecer seus habitantes, sejam eles israelenses ou palestinos. Publicado em dez línguas, este é um livro questionador, e por isso mesmo necessário, assim como todos os que se propõem lançar novas luzes sobre a História e seus mitos.

Sand, Professor de Historia Contemporânea na Universidade de Tel- Aviv, nega que os judeus constituam um povo com uma origem comum e sustenta que foi uma cultura especifica e não a descendência de uma comunidade arcaica unida por laços de sangue o instrumento principal da fermentação proto- nacional.

Para ele o «Estado judaico de Israel», longe de ser a concretização do sonho nacional de uma comunidade étnica com mais de 4 000 anos, foi tornado possível por uma falsificação histórica criada no século XIX por intelectuais como o jornalista judeu-austríaco Theodor Herzl ( 1860-1904).

Enquanto acadêmicos israelenses insistem em afirmar que os judeus são um povo com um DNA próprio, Sand, baseado numa documentação exaustiva, ridiculariza essa tese sem bases científicas e que produz trágicas reminiscências para quem era “acusado de judeu “ em plena Europa civilizada na primeira metade do século passado. O estranho da teoria dos acadêmicos de Israel é que exatamente eles patrocinem essas teorias raciais. A não ser que seja verdadeira a tese de certo filósofo quando afirma que o assim chamado povo judeu tem uma entranhada tendência para a tragédia.

Na verdade, não existem pontes biológicas entre os antigos habitantes dos reinos da Judéia e de Israel e os judeus do nosso tempo. O estudo de Shlomo Sand é bem fundamentado e demonstra com recentes achados arqueológicos e outros que judeus sefaraditas e askenazis, são uma mescla de muitas etnias que por injunções históricas, através dos tempos, adotaram a religião judaica.
Um pouco de história

No ano de 711 de nossa era, tropas islâmicas oriundas do Norte de África sob o comando do general Tárique, penetraram na península Ibérica. Nos séculos seguintes, os muçulmanos foram alargando suas conquistas e assenhoreando-se do território designado em língua árabe como al-Andalus, o qual governaram por quase oitocentos anos. Nessa época enquanto a Europa atravessava a “era das trevas”, os países da órbita islâmica praticavam e aprimoravam a filosofia, a medicina, a matemática, a arquitetura, a astronomia e a tolerância racial e religiosa. Aportaram aos europeus inúmeros conhecimentos de grande valor como a numeração arábica (com a noção do zero), o astrolábio, procedimentos e instrumentos médicos como a anestesia, a trepanação craniana e o fórcipe obstétrico, foram intermediários de toda a cultura grega tanto a literária com suas magníficas tragédias, além da filosofia e a álgebra, a geometria, a trigonometria de sábios como Aristóteles, Euclides, Hipócrates, Galeno, Sócrates,Platão, Sófocles e enfim de toda a sabedoria helênica. Deve ser mencionado por importante, duas eventualidades. Na Córdoba dos califas existiam setenta bibliotecas que reuniam mais de um milhão de obras e, ainda, que havia dois costumes muçulmanos implantados na Europa e que até hoje não foram integralmente adotados: a tolerância racial e religiosa e o banho diário. Nas casas de arquitetura árabe sempre se encontram um pátio interno ajardinado com um poço. E a belíssima catedral de Santa Maria La Blanca em Toledo, de estilo mudéjar, foi sucessiva e mesmo por vezes simultaneamente mesquita, sinagoga e templo católico. Então, se na época existisse prêmio Nobel, os árabes, como os judeus de hoje, levariam quase todos.

E se retrocedermos aos séculos anteriores de nossa era cristã e mesmo nos séculos posteriores, veremos que os chineses, por exemplo, inventaram e utilizaram sempre com objetivos pacíficos, técnicas e instrumentos que revolucionaram e fizeram progredir o conhecimento humano. Numa retrospectiva sucinta, apenas citaremos algumas das invenções elaboradas nas diversas dinastias que imperaram na China desde tempos imemoriais:
- ábaco
- álcool etílico
- asa delta
- balões
- bússola
- carrinho de mão
- macarrão
- pandorgas
- papel
- pólvora
- sismógrafo
- seda


Assim, também muitos chineses seriam premiados caso o químico e inventor sueco Alfred Nobel (1860-1904) estivesse estipulado no Império do Meio uma quantia monetária anual para atividades científicas e literárias importantes para o progresso humano.

Enfim, remeto meus prezados amigos judeus, ao lúcido e autêntico intelectual Edward W. Said (1935-2003), cidadão palestino-americano que passou a vida lutando pela paz entre árabes e judeus e para sua afirmação:“A maioria das pessoas resiste à ideia de que a identidade humana não é natural nem estável. Sabemos hoje que ela é construída e muitas vezes inventada”.



*Franklin Cunha é médico.





Fonte: Sul21
Imagens: Google

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